A Ciência Cidadã nos Açores
A Ciência Cidadã é definida como a colheita voluntária de informação sobre a biodiversidade e ambiente, contribuindo, assim, para a expansão do nosso conhecimento do mundo natural. Esse conhecimento é feito através da monitorização, colheita de dados e/ou interpretação das observações feitas ao ambiente (Tweddle et al., 2015; Silvertown 2009).
Até ao século XIX, a maioria das ciências naturais era realizada unicamente por cidadãos não remunerados. Por exemplo, Benjamin Franklin foi impressor, diplomata e político; Charles Darwin, por seu turno, viajou no Beagle como acompanhante do capitão Robert FitzRoy, sem qualquer remuneração e, também, não como um naturalista profissional (Silvertown, 2009).
Fora estes, muitos outros cidadãos no passado colectaram informações e dados acerca do mundo natural, sendo eles caçadores, agricultores ou mesmo naturalistas amadores, que poderiam ser considerados como cidadãos cientistas (Miller-Rushing et al., 2012). Porém, no final do século XIX, a ciência profissionalizou-se e os amadores quase que desapareceram (Miller-Rushing et al., 2012; Silvertown, 2009).
Uma das grandes vantagens de envolver cidadãos, nas áreas das ciências, tem a ver com o facto de que, assim, se conseguir gerar muito mais quantidades de informação para posterior análise, do que apenas um simples investigador. Simultaneamente, a Ciência Cidadã pode ser um meio de ligar as pessoas à ciência (Pocock, 2017).
Por exemplo, o primeiro documento conhecido de projeto de Ciência Cidadã data da altura de 1900, com a Contagem de Pássaros no Natal (Christmas Bird Count – CBC), inicializada por Frank Chapman, como alternativa a tradicional Caça de Natal (Christmas hunting) (Silvertown, 2009). Desde essa altura que esse projeto começou a ser uma importante fonte de dados científicos na contagem de espécies de pássaros na América do Norte (Silvertown, 2009).
Outra grande vantagem, ao envolvermos cidadãos nas recolhas de dados, tem a ver com estudos relacionados sobre as espécies invasoras, em que a ajuda destes permitem-nos ter uma visão mais realista da áreas de dispersão das espécies. A área de recolha torna-se muito mais vasta, tornando os nossos resultados muito mais credíveis e compreensíveis (Roy et al., 2016). Adicionalmente, ao incluir o cidadão comum no levantamento de dados nas mais variadas áreas de estudo, permite-nos incutir mais civismo na população, tendo em conta que, assim, estarão mais cientes dos verdadeiros problemas que lhe acercam, levando a uma maior participação na sociedade, contrariamente se esses não estivem envolvidos (Jordan et al., 2011; Couvet et al., 2008).
Atualmente, vários projetos no mundo estão a ser executados através da participação ativa de voluntários, como por exemplos, o projeto de Censos das Borboletas (https://www.nationalgeographic.org/idea/citizen-science-projects/), Contagem de Flores e Abelhtas (https://www.zooniverse.org/projects), entre outros. A nível europeu, países como a Grã Bretanha, França ou Alemanha têm desenvolvido vários trabalhos extremamente interessantes, como é o caso do trabalho sobre a expansão da joaninha Harmonia axyridis na Europa (http://www.ladybird-survey.org/).
Os países do sul da Europa, embora já tenham aderido a esse conceito, ainda estão muito atrasados em relação aos países do norte. Em Portugal e Espanha, por exemplos, comparativamente a outros países europeus, ainda existe um número muito baixo de voluntários no que concerne a participação de cidadãos em projetos científicos (Oliveira & Carvalho, 2012). Apesar disso, ainda existem alguns projetos que estão a ser desenvolvidos como o caso das Invasoras.pt (da Escola Superior Agrária | Instituto Politécnico de Coimbra Centro de Ecologia Funcional |Universidade de Coimbra), ou o mosquito WEB (do Instituto de Higiene e Medicina Tropical da
Universidade Nova de Lisboa).
Nos Açores, a Ciência Cidadã é um novo conceito e ainda pouco divulgado. Apesar disso, algumas localidades e entidades possuem centros de educação ambiental ou projetos científicos, num nível mais lúdico, como é o caso do Observatório Vulcanológico e Geotérmico dos Açores (OVGA), Observatório Astronómico de Santana (OASA) e Centro de Educação Ambiental da Ribeira Grande, pertencente à Santa Casa da Misericórdia da Ribeira Grande (CEARG). Apesar de ainda não apresentarem projetos, o público alvo é o cidadão comum onde o intuito é o de incutir valores ambientais e permitir que tenham uma participação mais ativa nas questões do ambiente.
Este presente trabalho pretende justamente avaliar a corrente situação nos Açores, em relação aos projetos de ciência cidadã, bem como pretende instalar um projeto piloto em São Miguel, de forma a ser expandido À todas as ilhas do arquipélago, usando, para isso, as joaninhas existentes na Região como espécie alvo.
Renato Calado